sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Senhora Dôuta e o frio

Algumas vezes Senhora Dôuta não sabia o que fazer. O frio estava aí, “aquecendo” e esquecendo as almas, diante do fogo e da verdade, com as asas da justiça abanando os corpos desavisados. O frio que é quente à alma dos que tem condições de o curtir, mas que, por outro lado, arrasa os descamisados.

Na beira da fogueira seu cachorro Alasãones berrava querendo água, ela estava toda petrificada pelo frio abaixo de zero. Senhora Dôuta esbugalhava as pedras e do resvalo que delas saíam eles bebiam.

_ Quero virar gelo também! – confessou em desejo Senhora Dôuta. Pegou o saca-rolhas e enfiou no olho esquerdo, desbugalhando-o para fora da face. Queria morrer. Perdera o medo da dor. Alasãones olhando aquilo ruivou assustado. Enquanto gritava, Senhora Dôuta enfiou o saca-rolhas no olho restante e também o esbugalhou para fora da face.

Tinha tudo para curtir o frio, mas preferiu a morte, quem sabe se porque no íntimo o gostava tanto que quis se juntar a ele. Mas, a forma que usava talvez não fosse a melhor. Logo pegou uma tesoura e deu uma tesourada na face, pegando lábios e nariz. Quem tiraria a vida de Senhora Dôuta para dar fim aquele espetáculo de horror?

Ela então abriu as portas e saiu correndo por entre a neve e o clima congelante do interior do Canadá. Foi atropelada por um carro que se desgovernou ao vê-la correndo pelas estradas e morreu. Em paz?

Um comentário:

Dani Amorim disse...

Em paz? acho que não ein, arregalei o olho lendo, muito bom o texto.